domingo, 23 de julho de 2017

Entranhada na cultura ....





Bebês tomando mamadeira. Em várias cores. Anos 60. Brinquedos.

Essas bonecas (feias) vinham cheias de rebarba na cabeça, imperfeições do processo de fabricação. Eram afiadas essas rebarbas, chegavam a cortar a gente ... Só que hoje, fazendo uma pesquisa no Google Images, eu levei um choque ao perceber que elas davam mamadeira pros tais bebezinhos que carregavam (!). Isso "passava batido" pra gente naquela época.



Da mesma forma que isso continuou "passando batido" pra mim quando eu estava curso de Desenho Industrial e, junto a um colega, me dediquei a projetar uma bolsa mais adequada do que as até então disponíveis para o transporte de utensílios de bebê: e lá está a mamadeira, como item indispensável (!). Pensamos até em um bolso térmico específico para mantê-la na temperatura adequada (!), assim como a papinha industrial (!).





É claro que atualmente faço a mea culpa embora, apesar de uns errinhos de datilografia, a pesquisa tenha sido realizada com muitas idas a praças pra conversar com as mães, pretensas futuras usuárias de nossa bolsa.

O ano era 1978, por aí. Fazia bem pouco tempo que o consenso científico internacional havia reconhecido a superioridade do leite humano e responsabilizado a indústria de fórmulas infantis por imensa parte do desmame precoce de trágicas consequências que houvera sido denunciado no relatório "The Baby Killer", de Mike Muller, em 1974.

Mea culpa porque devíamos ter conversado com profissionais da saúde também, antes de incluir a mamadeira como utensílio nobre desse projeto. Só que teríamos 99,9% de chance de sermos incentivados também por esses profissionais a incluir a mamadeira na bolsa que projetávamos, pois poucos sabiam disso, mesmo dentre aqueles que mais deveriam saber ...

Bem, quase 40 anos se passaram desde então. A informação sobre os problemas da mamadeira e dos leites artificiais pode ser obtida na internet sem dificuldade (desde que se queira encontrá-la). OMS e Unicef, WABA, Ibfan, Baby Milk Action, Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano, La Leche League e mais um monte de iniciativas da sociedade civil esclarecendo e divulgando o problema e apoiando, promovendo e protegendo a amamentação.

Mas prosseguem sendo concebidas, projetadas, produzidas, vendidas e consumidas bolsas para bebê que reservam lugar de destaque para as mamadeiras, como pode ser assistido no vídeo que me foi noticiado e que inclui como utensílio nobre também uma lata de Aptamil.

Design Diaper Bag:





A mamadeira está entranhada na cultura. É claro que há pessoas que continuam e continuarão empregando o produto para alimentar seus filhos pequenos, por opção.

O problema grave que percebo é que esses produtos induzem quem não necessariamente optaria a faze-lo a utilizar a mamadeira para preencher aquele espaço tão cuidadosamente destinado a ela. Assim é como se escolhêssemos, todos, admitir a mamadeira como natureza.

Daí a importância da pesquisa aprofundada em design, pois será duvidando das coisas que se impõem como ponto pacífico na cultura que conseguiremos restaurar no público a prática de refletir seriamente sobre suas escolhas de consumo.


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